Café

Ana Claudia de Souza
2 min readDec 7, 2021

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Há menos de 10 dias, fiz uma tatuagem retratando um pé de café.

Não sou uma grande conhecedora de cafés. O café que eu consumo 99% das vezes é o de torra escura que dizem ser de baixa qualidade e propositalmente “queimado” pra esconder as impurezas. Vez ou outra tomo um expresso nalguma cafeteria mas também não sei bem a procedência do grão.

Tenho vontade de conhecer cafés diferentes e até de entender um pouco mais sobre a bebida. Antes de fazer essa tatuagem até me questionei se deveria fazê-la pois, e se ao conhecer o “café bom” eu me decepcionar e perceber que não gosto de “café de verdade”? Será que eu não deveria antes ir àquela degustação que eu tava planejando e fazer aquele curso de barista que a pandemia me fez adiar?

Mas é uma porra mesmo, depois que a gente passa a se identificar com o comunismo, a gente olha pra tudo por uma perspectiva diferente. E então me peguei pensando se essa minha dúvida sobre tatuar ou não o café não era fruto de uma ideia elitista que eu comprei mesmo sem querer.
Uma ideia de que para que possamos nos declarar apreciadores de algo precisamos conhecer versões que são produzidas para um público abastado.
É fato que os melhores produtos que são produzidos pelas mãos de trabalhadores pobres — muitas vezes pretos — aqui no Brasil, são exportados, e se quisermos ter a oportunidade de conhecer um produto de qualidade superior, precisamos comprar importados que não raro, nasceram em solo brasileiro mas foram dar um rolê lá fora, passaram por processos de “gourmetização” e voltaram algumas vezes mais caros. E aí, por não ter tido a oportunidade de conhecer estes cafés eu não poderia/deveria registrar meu gosto pelo café que eu conheço, tomo e gosto?

Minha maior referência de café é o café comum, de supermercado, cujo pó é cozido pra render mais e coado em coador de pano pra evitar os gastos com coador de papel. Sacou? Tenho também uma cafeteira dessas que se popularizaram, de cápsulas, que ganhei de presente e que me brinda quase diariamente com um café pós almoço e que eu considero um pequeno luxo.

E ainda que eu experimente cafés mais finos e venha a não gostar, minha tatuagem não estará sendo incoerente como eu cheguei a acreditar por alguns instantes. Ela continuará representando o fruto que da origem à bebida de sabor amargo que me proporciona energia para enfrentar as adversidades do dia-a-dia.

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Ana Claudia de Souza

Poeta, ilustradora, militante, periférica, ateia, marxista-leninista.